25 DE MAIO
O PANAFRICANISMO DA OUA À UNIÃO AFRICANA (1963/2020)
ANGOLA: ENTRE O GRADUALISMO E O INTEGRACIONISMO (1976/2020)
Por: Belarmino
Van-Dúnem
- O PANAFRICANISMO DA OUA À UNIÃO AFRICANA (1963/2020)
O Panafricanismo no continente
africano tem as suas origens no combate iniciado pelos negros americanos e
antilhanos contra a dominação por parte das pessoas de raça branca. Este
movimento começou no século XIX, mas rapidamente os afro-americanos
compreenderam que a mesma opressão era vivida pelos seus ancestrais no
continente africano e a exportação do idealismo da igualdade foi expandido para
África.
O Panafricanismo no continente
Americano apresentou várias facetas, alguns percursores, como William Edward
Burghardt Du Bois preconizava uma igualdade de direitos entre brancos e negros
sem qualquer discriminação de raça, origem social ou credo religioso. Mas
outros, como o Jamaicano, Marcus Garvei, eram mais radicais e defendiam o
retorno de todos os afro-americanos para o continente da sua origem.
Até ao final do Sec. XIX, o Panafricanismo
aparece como protesto, reclamação de inclusão e um certo saudosismo de terra
que já não existia: África unida, com os seus reinos autónomos e tradicionais,
com as suas politicas e organização própria.
Embora, Henry Sylvester
Wllliam, tenha sido o primeiro a reclamar a extensão dos direitos de igualdade
para lá do Atlântico, quando na conferência de Londres, em 1900, fez as
seguintes reivindicais:
- Assegurar os direitos civis e
políticos dos africanos em todo o mundo;
- Melhorar as condições dos
africanos em qualquer lugar onde se encontrem;
- Promover esforços para assegurar uma
legislação efectiva e encorajar os povos africanos nas empresas educativas,
industriais e comerciais e;
- Incrementar a cooperação entre os três
Estados negros: Haiti, Abissínia e Libéria, através do envio de um memorando
aos Chefe de Estado dos três Estados, sublinhando a necessidade urgente de
consolidarem os seus interesses e combinarem os esforços no plano diplomático
(Michel Kounou 2007:107).
O espírito panafricanista tem evoluído ao longo do tempo e como toda a
evolução acarreta mudança. O Panafricanismo actual pouco ou nada tem de
semelhante com a teoria panafricanista defendida pelos descendentes de escravos
africanos no Caribe, Estados Unidos da América e na Europa.
A perspectiva mudou lá e aqui em
África: os descendentes dos africanos nas Américas ou na Europa já não defendem
o seu retorno para África nem sonham com uma África idílica, de liberdade e
fartura. Por outro lado, os Africanos já não clamam por autodeterminação e um
dos princípios dos Estados é a defesa da soberania e integridade territorial,
ao contrário das confederações defendidas por muitos líderes nas décadas de
50/60. Aliás, mesmos os descendentes de africanos que emigraram para a Europa e
para os EUA depois das independências dos Estados africanos clamam por uma
integração como cidadãos daqueles países. Para os descendentes dos europeus em
África a realidade não é diferente, também reclamam a cidadania dos países
africanos.
Os líderes estavam divididos, entre os que
defendiam uma África próxima das metrópoles ou colonizadores e os que
apregoavam uma ruptura com os antigos opressores. A divisão era de tal formas
estrutural que se formaram dois grupos: o grupo de Brazzaville, integrado pelos
países que defendiam uma aproximação à metrópole e o grupo de Casablanca que
apregoava ruptura.
Há uma evolução política/ideológica
na passagem do Panafricanismo dos afro-americanos para o continente africano
propriamente dito. No continente africano, numa primeira fase, existiram
pretensões federalistas, tais como o movimento panafricanista de Namdi Azikiwe
que criou “o Concelho Nacional da Nigéria e dos Camarões” (NCNC), podemos
também citar o modelo do “Convention People Party” dirigida por Nkrumah, que
embora esteve limitado ao Gana, se inscreveu com o status de uma realização
imperiosa para “criação de uma federação do Oeste africano”, a primeira etapa da
via para o Panafricanismo (Zerbo 2004:16). Mas podemos acrescentar ainda
Movimento panafricano para a Libertação da África do Leste e Central
(Panafrican Freedom Movement for East and Central África – PAFMECA).
A euforia apoderou-se dos
intelectuais africanos que fizeram do Panafricanismo um movimento de vanguarda:
Sékou Touré (Guiné); Jomo Kenyatta (Kennya); Modibo Keita (Mali) e; Gamel Abd
El Nasser (Egipto) impulsionaram o movimento e reivindicaram a independência de
todos os territórios africanos, perspectivando uma unidade federal do
continente.
Os líderes africanos criaram o
meio-termo entre os que defendiam a roptura com os Estados colonizadores e os
que achavam que era necessário ter alguma relação com as ex-coloniais, foi
criada a Organização de Unidade Africana em 1963, apadrinhada pelo Imperador da
Etiópia, Haille Salassie, transformada em União Africana desde 2000.
A integração regional passou a
ser um dos objectivos principais, mas o continente assistiu à uma proliferação
de comunidades económicas regionais que levou a maioria dos Estados ficar numa
situação de dupla e múltipla filiação, privilegiando mais as estratégias
políticas ligadas à segurança do que propriamente as questões económicas. Essa
realidade levou os Chefes de Estado e de Governo da União Africana a fazer um
recuo. Em 2006, na sesta sessão da Assembleia Geral dos Chefes de Estado e de
Governo foi decidida oficialmente a divisão regional do continente, procurando
evitar que as sub-regiões reclamassem o direito de criar as suas próprias
organizações económicas regionais. Mas, só em 2008, é que os Chefes de Estado e
de Governo decidiram reconhecer apenas oito organizações económicas regionais,
nomeadamente: 1. Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC); 2.
Autoridade Intergovernamental para o Desenvolvimento (IGAD); 3. Comunidade
Econômica dos Estados da África Central (CEEAC); 4. União Árabe do Magrebe
(UAM); 5. Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO); 6.
Comunidade dos Estados Shael-saarianos (CEN-SAD); 7. Mercado Comum da África
Oriental e Austral (COMESA) e; 8. Comunidade da África Oriental (EAC) (In
Belarmino Van-Dúnem 2010).
O pensamento da Unidade do
continente africano continua, tanto é assim que maioria dos Estados africanos
subscreveu à Zona de Comércio Livre Africana. Embora as trocas comerciais ainda
sejam muito baixas.
2. ANGOLA: ENTRE O GRADUALISMO E O
INTEGRACIONISMO (1976/2020)
A República de Angola está
geopoliticamente posicionada entre as regiões Austral e Central de África por
continuidade da massa continental. Partilha a sua fronteira a norte com a
República do Congo e a República Democrática do Congo (RDC), a Leste com
República da Zâmbia e a Sul com a República da Namíbia, a Oeste é banhada pelo
Oceano Atlântico conforme o mapa geofísico acima apresentado.
Desde a independência Angola
sempre esteve engajada na dinâmica da União Africana. Em 1963 não era
independente, mas os movimentos de libertação nacional estiveram presentes em
Addis Abeba. Em 1976 Angola foi reconhecida e de lá para cá o país esteve
sempre activo nas dinâmicas do continente africano, quer ao nível bilateral
como multilateral. Na região Angola
integrou os Países da Linha da Frente, a SADCC, é membro fundador da SADC e
membro de pleno direito da CEEAC.
No que concerne ao
posicionamento geopolítico está inserida na CPLP, nos PALOP, na Comissão do
Golfo da Guiné, na Organização do Países Não-Alinhados, na Comissão dos Países
do Atlântico Sul e apresenta tendências para se projectar em outros espaços
através de projectos e acordos bilaterais.
A análise da diplomacia e da
política externa dos Estados africanos pode ser feita através da pesquisa
documental, mas sobretudo através da monitorização directa dos actos oficiais
liderados pelo Chefe do Executivo e dos seus auxiliares.
No que
respeita ao estudo e análise da política externa da República de Angola, em
particular, a situação não é muito diferente dos restantes países africanos.
Não existe, até à data, planos públicos oficiais que nos permitam prever as
acções da política externa angolana e poucos documentos que existem são textos
escritos que tenham feito esse tipo de abordagem, também existem várias
colectâneas e obras de investigação dedicadas à análise do posicionamento
geoestratégico de Angola e da sua política externa.
Daí a minha
firme convicção da urgência de se criar um fórum de forma abrangente ou
restrita para o tratamento da política externa de Angola, cuja sistematização é
essencial para os académicos, mas sobretudo para os parceiros internos e
externos que passarão a ter noção das directrizes do Executivo, tal como os
Estados estratégicos do ponto de vista das parcerias, as áreas prioritárias, os
mecanismos para implementação, monitorização e avaliação das acções e os fins
que se pretende alcançar com cada um dos parceiros e consequentemente com as
estratégias pré-estabelecidas. Tudo isso indicando as regiões seleccionadas
onde a acção da política externa seja projectada.
Actualmente Angola continua no
mesmo dinamismo e, nos últimos três anos, houve uma intensificação dos
contactos directos (diplomacia directa) com as organizações internacionais e ao
nível bilateral. No entanto, há necessidade de se implementar os planos para
que exista maiores trocas comerciais entre Angola e os países da África Austral
e com o continente africano de forma geral.
Angola tem mostrado sinais da
sua vontade em integrar à Zona de Comércio Livre da SADC, sendo praticamente o
único Estado fora do acordo. Entre estudos e preparação da documentação, Angola
deve ter em conta vários factores, com especial realce para a economia, em que
as vantagens complementares, comparativas e competitivas devem merecer
prioridade.
No que toca as exportações
intra-continentais, segundo a Comissão Económica das Nações Unidas para África
(2019), a África do Sul domina com 45 por cento do total em três dos cinco
principais sectores. Nomeadamente, equipamentos de maquinas e transportes (60.2
por cento), alimentos (28.9 por cento), mineiros e metais (25.4 por cento). Portanto
justifica-se a adopção de um tratamento diferenciado. Embora seja necessário
prestar uma atenção especial à outros países da região, tal como o Reino de
Eswatini (ex Botsuana) que detém uma média de 20.1 por cento das exportações de
produtos agrícolas no continente africano. A Namíbia tem 3.1 por cento do total
das exportações para África, enquanto o Zimbabwe tem 2.7 por cento do total das
exportações para dentro do continente.
Os dados acima apresentados
servem para que o Estado angolano, no acto da apresentação da proposta de
desarmamento da pauta aduaneira possa equilibrar, sabendo antecipadamente que
tipo de produtos é que poderão entrar no país no âmbito da Zona de Comércio
Livre e a sua origem, protegendo tecnicamente, de algum modo, eventuais
produtos nacionais.
Angola não está entre os 15 países que mais
exportam no continente africano ou mesmo na região Austral de África, por isso
é urgente acelerar a produção de alguns produtos de preferência manufacturados
e não matérias-primas para participar de forma efectiva na zona de comércio
livre da SADC. Este facto requer uma análise comparativa e da complementaridade
relativamente aos outros Estados que fazem parte da organização porque não
adianta entrar na lógica da competitividade tendo em conta as outras fases do
processo de integração económica em que o desarmamento da pauta aduaneira será
total, nomeadamente na fase da União Aduaneira.
O Presidente João
Lourenço desde a sua tomada de posse, nos últimos três anos, tem se desdobrados
em várias viagens no continente africano. É um dos presidentes africanos com o
qual os homólogos contam sempre, aliás conseguiu, em pouco tempo, granjear a
empatia inclusive dos Chefes de Estado veteranos no continente, como é o caso
de Denis Sassou Nguesso, Paul Kagame, Yoweri Museveni e inclusive uma
aproximação à África do Sul que, tanto o ex-Presidente Jocob Zuma como o actual
Presidente da África do Sul Cyril Ramaphosa fizeram de Luanda um porto seguro.
O sinal de integracionista
que o Presidente João Lourenço deu, foi a aceleração do processo para que
Angola possa aderir à Zona de Comércio Livre da SADC. Mas sobretudo a adesão no
grupo da frente ao Acordo sobre a criação da Zona de Comércio Livre Continental
Africana. As acções fazem colocar o Presidente João Lourenço no Grupo de Chefes
de Estado Integracionistas, ou seja, que defendem a União Africana do
continente africano.
Assim vai o continente
africano, entre os Gradualistas e os Integracionistas, mas o que é mesmo
necessário é a intensificação das trocas comerciais e uma maior atenção à
produção nacional.
3. CONCLUSÃO
O Panafricanismo
prevalece enquanto valor político e há uma tendência para expressar apoio à uma
unidade entre os Estados africanos. Mas na prática o continente africano
continua a funcionar com várias velocidades uma vez que os instrumentos das
organizações internacionais intra-africanas são subscritos em função das
vantagens que líderes africanos encontram no momento, raramente têm uma visão
de futuro que inclua o continente ou a região como um todo.
A maioria dos Chefes de
Estado e de Governo africanos só remete o argumento da unidade quando está em
causa interesses internos, nos casos adversos primam quase sempre pela defesa
do princípio da Não Ingerência nos Assuntos Internos do Estados.
A divisão entre os
defendem os princípios de Casablanca e de Brazzaville continua até nos dias que
correm. Os Estados africanos mantém relações económicas, sociais e politicas
mais intensas com o Ocidente do que entre os seus pares do continente. Os
quadros africanos fazem carreira no Ocidente e têm alguma dificuldade em se
impor nos seus países, o aprofundamento das democracias e das liberdades estão
por se concretizar.
O caso mais flagrante é o caso dos países Oeste
africanos da Zona Franco CFA que mantinha uma relação de dependência financeira
com a França que constituía um verdadeiro atentado aos princípios básicos da
soberania. Agora, no mês de Maio de 2020 o Presidente da França, Emmanuel
Macron, concretizou o acordo que prevê uma nova moeda para os países que será
regulada pelo Banco Central do Estados da África do Oeste (BCEAO9. Portanto, a
França deixará de fazer parte das estruturas governativas financeiras desses
países e a União Económica e Monetária do Oeste Africano (UEMOA) composta Benim,
Burkina-Faso, Cote d´Ivoire, Guiné-Bissau, Mali, Níger, Senegal e Togo que
negociaram todo o ano de 2019.
Mas para além dos
factores estruturais que ligam os Estados africanos às ex-potências
colonizadoras, há o problema da cumplicidade que as elites africanas mantém com
os países ocidentais, transportando para as capitais ocidentais bilhões de
dólares, facto que os coloca numa situação de submissão quer para proteger a
fortuna que muitas vezes tem origem ilegal, mas também para manter-se no poder
em detrimento do bem-estar dos povos africanos.
Angola tem se
posicionado como um actor activo no contexto africano. Não obstante o país
precisa de efectivar a sua adesão à Zona de Comércio Livre da SADC para não
ficar para atrás numa eventual União Aduaneira da Região. O estabelecimento do
princípio básicos da política externa e a consolidação de quadros nas
Organizações Internacionais poderão elevar o país aos patamares de potência
regional real.
Bibliografia.
Kounou, Michel (2007:107) in: Van-Dúnem,
Belarmino (2008), Prevenção de
Conflitos em África: Da Organização de Unidade Africana à União Africana,
Periploi, Lisboa
Van-Dúnem, Belarmino (2008),
Prevenção de Conflitos em África: Da Organização de Unidade Africana à União
Africana, Periploi, Lisboa
Van-Dúnem, Belarmino (2010),
Globalização e Integração Regional em África, Edição do Autor, Luanda
Websites
Van-Dúnem, Belarmino, 25
de Maio de 2020, Ed. Weya, Luanda - In: http://berlarminovandunem.blogspot.com.
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