Por: Belarmino Van-Dúnem
A
Cimeira dos Chefes de Estado e de Governo da União Africana de 2013, teve como
lema principal o "Renascimento do Pan-africanismo". Este lema carrega
um simbólismo e histórico muito grande, é fonte de inspiração e de esperança
para maioria dos povos africanos que continua a ver a sua expectativa de
melhores condições de vida gorada.
Os
líderes africanos pós-independência herdarem um continente que se encontrava a margem
do sistema internacional. O cenário das relações internacionais foi projectado
para privilegiar as potências vencedoras da segunda guerra mundial. Esta
realidade tem dificultado os Estados africanos cuja autodeterminação só
aconteceu a partir da primeira metade da década de 50.
O
espirito panafricanista tem evoluído ao longo do tempo e, como toda evolução
acarreta mudança, o panafricanismo actual pouco ou nada tem de semelhante com a
teoria panafricanista defendida pelos descendentes de escravos africanos no
Caribe, Estados Unidos da América e na Europa.
A perspectiva mudou lá e aqui em África: os
descendentes dos africanos nas Américas ou na Europa já não defendem o seu
retorno para África nem sonham com uma África idílica, de liberdade e fartura.
Por outro lado, os Africanos já não clamam por autodeterminação e um dos
princípios dos Estados é a defesa da soberania e integridade territorial, ao
contrário das confederações defendidas por muitos líderes nas décadas de 50/60.
Alias, mesmos os descendentes de africanos que emigraram para a Europa e EUA
depois das independências clamam por uma integração como cidadão daqueles
países, para os descendentes dos europeus em África a realidade não é
diferente, também reclamam a cidadania dos respectivos países.
O
pan-africanismo (África no centro de tudo) tem contornos revisionistas em
África. Os líderes estavam divididos, entre os que defendiam uma África próxima
das metrópoles ou ex-colonizadores e os que apregoavam uma ruptura com os
antigos opressores. A divisão era tão estrutural que se formaram dois grupos: o
grupo de Brazzaville, integrado pelos países que defendiam uma aproximação à
metrópole e, o grupo de Casablanca que apregoava ruptura. A terceira via foi
defendida pelo Imperador da Etiópia, Haille Salassie, dando origem a OUA 1963,
transformada em União Africana desde 2000.
Há
uma tendência para se criticar os Estados africanos por uma suposta má
governação e administração das riquezas nacionais. Na base dessas criticas está
o facto do paradigma de analise ser importado do Ocidente ou seja, os critérios
para se avaliar são os mesmos, ainda que se saiba que o Estados estão a partir
de metas diferentes, os hábitos e costumes não são os mesmos e os recursos, tal
como a sua exploração e gestão não obedecem os mesmos critérios. A intervenção
nos assuntos internos dos Estados é defendido de forma irrepreensível por
todos, mas há uma incapacidade material e estrutural para fazer vincar esse princípio.
A incapacidade dos Estados é transmitida às organizações regionais e continentais,
fazendo com que as potências coloniais e os EUA encontrem sempre margem para
intervir económica e politicamente nos assuntos de África.
A
União Africana ao realizar a sua Cimeira anual sob lema do Panafricanismo
levanta algumas questões que são recorrentes nos últimos vintes, trinta anos. A
primeira está relacionada com a necessidade de se reconhecer que a geoestratégia
da maioria dos Estados africanos que tem uma dimensão transcontinental,
sobretudo devido a geoeconomia dos países industrializados, incluindo a Africa
do Sul, Índia, Brasil, Rússia e a China, cuja diplomacia economia traspassa as
suas fronteiras, pousa da caça para obtenção de recursos energéticos e
minerais.
A
falta de competitividade dos Estados africanos é um dos factores que retarda a
implementação dos ideais pan-africanistas ajustados a nova era da economia
global. Penso não ser possível falar de um Panafricanismo puro, independente e
isolado dos problemas e das dinâmicas do mundo actual, pelo contrário, o Panafricanismo
deve renascer com uma visão futurista, visando uma África voltada para o mundo
e não para si própria.
Durante
a 20ª cimeira decorria em Addis Abeba de 21 a 28 de Janeiro de 2013, os Estados
africanos preparavam as condições para uma possível participação na força de
reposição da paz, soberania e ordem no norte do Mali. Alguns Chefes de Estados
concentraram-se na situação da República Centro-africana que, por um triz,
cairia nas mãos dos rebeldes, a RDC, como sempre, também preocupava na região
do Kivu e, para não falar da porosidade da fronteira com o Ruanda e o Uganda de
onde saem os maiores problemas.
Enquanto outros prepararam e afinavam os
discursos para a cimeira que, pela primeira vez, iria decorrer sem a relevância
dos países da África do norte que estão debilitados internamente. Nunca é de
mais lembrar que entre os cinco maiores contribuintes da União Africana, três
países estão situados geograficamente na África do Norte (Argélia, Egipto e
Líbia).
Enquanto
a dinâmica das relações internacionais africanas é essa, resolver problemas sem
meios nem soluções estruturais e duradoiras, a França avançou para o Mali,
enfrentou os rebeldes no norte do país e levou os Estados africanos de reboque.
Claro que os gasodutos e o petróleo da região tiveram um peso importante, mas a
pergunta é: deverá um Estado agir de forma diferente da França? Claro que não!
São recursos essenciais para a manutenção da indústria e consequentemente do
emprego e do bem-estar da população europeia que enfrenta uma crise económica e
financeira que faz lembrar os anos 30.
O
renascimento do pan-africanismo deve ter no centro a valorização do Homem e da
Mulher africanos, aumentar a capacidade de gestação das dinâmicas políticas e
sociais internas, defender uma visão transaccional e continental, capitalização
dos recursos internos e captação de outros recursos fora das fronteiras,
aprofundamento da segurança nacional no sentido lato, aposta no desenvolvimento
da massa critica e, dinamização de uma sociedade para o futuro. Assim teremos
um pan-africanismo porque de forma diferente a situação manter-se-á
eternamente.