sábado, 25 de fevereiro de 2012

DIPLOMACIA VIA EXPRESSO LUANDA – PRETÓRIA

Por: Belarmino Van-Dúnem

No dia 19 de Fevereiro de 2012, domingo, o Presidente da África do Sul, Jocob Zuma, fez uma passagem relâmpago por Luanda para, junto do seu homologo angolano, José Eduardo dos Santos, fazer um briefing sobre o encontro que alguns Chefes de Estados tiveram no Benin, a convite do Presidente daquele Estado que é também o actual Presidente exercício da União Africana.
Os Chefes de Estado de Angola e da África têm estado em concertações periódicas, tanto em território angolano como na África do Sul. Há uma diplomacia directa, via expresso entre Luanda e Pretoria, capital administrativa da África do Sul. Os dois Estados têm responsabilidades acrescidas na arena internacional, mas a conjuntura política no continente africano e nas sub-regiões que a compõem é bastante sensível no momento e só irá prevalecer com capacidade de influência o Estado que melhor gerir a situação actual.
A África do Sul acordou e acaba de sair do sistema de “The Quiet Diplomacy of Liberation”, ou seja, a diplomacia do silêncio que caracterizou o país durante o período de transição (Christopher Landberg 2004). Hoje a África do Sul reclama de alto e bom som, o seu direito de intervir, como potência continental, nas questões mais cadentes que afligem a região austral e o continente africano em geral. Nota-se uma aproximação do Estado sul-africano aos seus pares, durante o mandato de Nelson Mandela, a diplomacia era feita com base na figura do Chefe de Estado, a África do Sul era levada por arrasto, prevalecia a figura do Mandela herói, conciliador e respeitado por todos.
A ascensão de Thabo Mbeki criou uma espécie de retiro da África do Sul no que concerne ao empenho directo nos problemas do continente africano. O Presidente Mbeki era mais elitista, formalista e com uma visão estruturante, por isso fazia sentir a sua presença nos fóruns internacionais e, em muitos casos, foi indicado como representante do continente. A visão funcionalista de Mbeki pode ser constatada nas suas acções, tais como: Primeiro Presidente em Exercício da União Africana e Co-fundador da NEPAD (sigla inglesa: Nova parceria para o Desenvolvimento de África).
A escalada de Jacob Zuma até ao poder criou novas esperança da África do Sul ascender de uma potência económica, expandindo a sua influência para a arena política. Zuma apareceu com um discurso voltado para África, maior e melhores parcerias com os países que fazem a diferença, quer política ou económica. O seu primeiro passo foi colocar Luanda e Pretória no centro das decisões políticas a nível da SADC e da UA, esforço que vinha sendo feito por Angola há décadas.
A África do Sul actualmente é a “auto-estrada” diplomática da África Austral e do continente. É membro não permanente do Conselho de Segurança da ONU; está em permanente contacto com os países emergentes através do IBSA (sigla inglesa: Índia, Brasil e África do Sul); mas este grupo se juntou ao BRIC (Brasil, Rússia; Índia e China) que passou a BRICSA (Brasil, Rússia, Índia, China e South África).
Este grupo é estratégico, politicamente falando e até do ponto de vista económico porque congrega dois membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU e três Estados com as economias mais prósperas da actualidade e do futuro. Para fazer o complemento, a África do Sul está a bater-se nos corredores diplomáticos do continente para colocar uma cidadã nacional a presidir a Comissão da União Africana, caso esse facto venha a acontecer, 2012 será o ano da diplomacia sul-africana, aquele país preside o Órgão de Politica Defesa e Segurança da SADC.
Angola, por sua vez, sempre esteve no centro da diplomacia universal e africana. A República de Angola é património diplomático de África: o Príncipe N´Funta, baptizado com o nome de António Manuel, com a alcunha de “Negrita” foi o primeiro Embaixador africano junto da Santa Sé em Roma, enquanto enviado de Sua Majestade, o Rei Mpangu-a-Nimi-a-Lukeni (Dom Álvaro II) em 1608, ano da sua precária chegada a Roma onde veio a falecer dias depois. Durante os séculos XVII, XVII e XIX, vários reis e rainhas destacaram-se como verdadeiros diplomatas, procurando a paz através do diálogo, com especial destaque para a Rainha N´Jiga M'Bande Ya N'Gola Kiluange Kya Samba.
No século XX, Angola destacou-se, principalmente desde a década de 50, quando os nacionalistas angolanos começaram a utilizar a via diplomática para denunciar os horrores do colonialismo, reivindicando a autodeterminação do território nacional. Essa dinâmica levou Angola a estar no centro da discussão nos fóruns mundiais, mesmo antes da independência, o território já era alvo de acesos debates na ONU.
Nas décadas de 70 e 80 Angola foi o centro da Guerra Fria em África, bateu-se pela independência do Zimbabué, da Namíbia e para o fim do Apartheid na África do Sul. O Primeiro Presidente de Angola, António Agostinho Neto caracterizava-se por ser um incontestável defensor dos direitos dos africanos e pana-fricanista convicto.
O Presidente José Eduardo dos Santos soube dar continuidade a esse legado, o Estado angolano é co-fundador da CPLP, dos PALOP, SADC e UA. Assenta a sua diplomacia na boa vizinhança e na prestação dos bons ofícios nos sectores da Paz e da Segurança, sem perder de vista a diplomacia económica, fim - último de qualquer politica externa.
A República de Angola granjeou um lugar no centro da diplomacia africana, o corredor diplomático Luanda – Pretória irá beneficiar os dois Estados e o continente e, caso os projectos de industrialização nacional se concretizem poderemos ver o grupo BRICSA, a transformar-se no BRICSAA (Brasil, Rússia, Índia, China, South África e Angola), até porque Angola tem uma parceria estratégica com o Brasil e a China; relações históricas com a Rússia, há um ambiente de diálogo salutar com a Índia e a “Diplomacia via expresso, Luanda – Pretoria vai de vento em popa”.


PRESIDENTE ABDOULAYE WADE ENTRE A ESPADA E ESPADA


Por: Belarmino Van-Dúnem

O conceito de democracia tem vindo a transformar-se ao longo do tempo. Desde a Grécia antiga onde o Poder do Povo tinha limitações de abrangência e inclusão, por exemplo as mulheres não votavam e os mais pobres não podiam ser candidatos a cargos públicos porque as funções de Estado não eram remuneradas, passando pelos tempos da discriminação pela raça e/ou sexo que os europeus durante vários séculos praticaram.
Actualmente, as principais questões prendem-se com as limitações de tempo, ou seja, se até a metade do século passado, o que se pedia e exigia era o cumprimento dos parâmetros constitucionais, actualmente levanta-se a falsa questão do tempo. Ninguém pode permanecer muito tempo no poder, tem que dar oportunidade aos outros. “Por amor de deus”. Quem manda é povo e a personalidade que está no poder deve consultar o povo para legitimar o exercício do poder. Inclusive podemos ir mais longe e afirmar que o voto popular não é, para a maioria dos casos, a forma mais assertiva de legitimar o exercício do poder. Sobretudo em África onde as clivagens étnicas, políticas e sociais são muito salientes.
Os problemas dos limites temporais no poder trazem ainda outro problema estrutural. O facto dos projectos políticos e de sociedade ficarem por concretizar, sabemos que a transformar da sociedade só é possível atravessando pelo menos duas gerações de dez anos. Ainda coloca-se o caso dos políticos que fazem uma espécie de permuta, ou seja, fica tu e depois volto eu.
O Presidente do Senegal, já no fim do seu segundo mandato de cinco anos, é um exemplo claro desse dilema. Quando foi eleito no ano 2000, colocou fim à mais de 40 anos de domínio socialista (PS) no Senegal no poder desde 1958. Actualmente com 86 anos de idade, o Presidente Wade, através do seu Partido PSD, efectuou uma alteração na constituição que colocou fim as limitações de candidaturas a presidência de dois mandatos de cinco anos cada. Mas, como é próprio dos juristas, a interpretação da lei está a provocar divergências. Uns defendem que a lei deve ser retroactiva, ou seja, as eleições do próximo dia 26 de Fevereiro de 2012 devem ser efectuadas com base na constituição de 2001. Mas outros acham que o Presidente Wade não está abrangido pela nova lei constitucional, portanto pode renovar o seu mandato pela terceira vez. Alias, o Tribunal constitucional já aceitou a sua candidatura.
A oposição e a sociedade civil é que não baixaram os braços e fizeram um levantamento contra a candidatura do actual presidente, que a luz da nova Constituição teria mais um mandato de sete anos. O movimento Forças Vivas da Nação de 23 de Junho (M23) cujo único objectivo é impedir a candidatura de Abdoulaye Wade, congrega a maioria dos partidos da oposição. O Conselho Constitucional do Senegal recebeu dezassete candidaturas, catorze foram aprovadas, mas os recursos não param de crescer.
A oposição está a perder sinergias porque não conseguiu um candidato consensual. Uma análise fria dos factos mostra que o problema pode não ser o presidente Wade, mas o facto de não existir um candidato a altura, no seio da oposição, para fazer face ao actual Presidente. Todos os candidatos da oposição alegam ser candidatos naturais e com probabilidade de vencer. Mas o mais mediático é o cantor e empresário Youssou N’Dour, embora não tenha qualquer tipo de experiencia política e até na administração pública.
A maior surpresa veio do Ocidente. Os EUA e a União Europeia, como sempre, decidiram posicionar-se e apelaram ao Presidente Wade que retirasse a sua candidatura, partindo para ameaças e tudo. Independentemente dos contornos existe a certeza que o Senegal que sempre teve alguma estabilidade, está a caminhar para o caos e as novas formas de impor democracia não respeitam a constituição dos Estados, mas o desejo ou não da opinião visível querer ou não quem está no poder.
É necessário repensar as formas de organização das sociedades, porque há tendência de existir um aproveitamento dos partidos políticos com relação aos midias: colocam os seus militantes nas ruas, aparecem duas centenas que passam a representar todo o eleitorado que, em alguns casos chegam a milhões. Se quem está no poder toma a decisão de colocar os seus apoiantes na rua, o acto fica catalogado como repressão e não só.
O Presidente Wade está entre a espada e a espada porque caso retire a sua candidatura estará a dar razão aos partidos da oposição e o seu partido já não vai a tempo de indicar um outro candidato. Se der continuidade a sua candidatura pode estar a caminhar para o início de uma escalada da violência que manchará para sempre a sua carreira. Agora é fazer ao contrário de São Tomé, ver e esperar.

18ª CIMEIRA DA UNIÃO AFRICANA

Por: Belarmino Van-Dúnem

A 18ª Cimeira dos Chefes de Estado e de Governo da União Africana constituiu um novo começo para organização continental a todos os níveis. Foi uma cimeira cheia de tensão e novidades: mais de uma dezena de Chefes de Estado e de Governo eram estreantes, alguns Estados ainda acordavam da turbulência de conflitos pós-eleitorais e a África do Norte participou no evento com o fantasma da primavera Árabe.
A Cimeira decorreu sob o tema “Reforçar o Comércio Intra-Africano”, mas desde a chegado do peritos ou delegações de avanço como são chamados os técnicos seniores nos fóruns internacionais, que as movimentações giraram a volta da renovação do Presidente da Comissão da União Africana e do Presidente em Exercício. Ao contrário do que tem sido costume, em que os Estados desistem das suas candidaturas para evitar a votação prevista nos estatutos da organização, na 18ª Cimeira tudo parece ter mudado, tanto para a Comissão como para a presidência em exercício havia rumores de que os pretendentes ao cargo iriam até a votação, mas só a África do Sul foi até ao fim na pretensão do cargo de Presidente da Comissão da UA.
A presidência em exercício estava reservada aos Estados da África Ocidental. O Benim desde muito cedo manifestou a sua intenção de assumir o cargo através do seu Chefe de Estado Yayi Boni. Mas houve notícias que os Presidentes da Nigéria, Goodluck Jonathan, e o do Gana, John Evans Atta Mills, também pretendiam candidatar-se para o cargo em nome dos seus Estados.
O gabinete do Presidente nigeriano fez sair um comunicado onde afirmou que, de facto, o Presidente Goodluck foi contactado por alguns Estados para assumir a presidência, mas que não era sua intenção devido a situação interna do país e, por outro lado, a Nigéria está na presidência rotativa da CEDEAO, portanto seria impossível cumprir com a agenda da União Africana. No que tange ao Gana não se conhece nenhuma reacção, nem a confirmar muito menos a desmentir a pretensão do cargo até a cimeira. O Chefe de Estado do Benin assumiu a presidência rotativa sem concorrência.
A mesma sorte não teve Jean Ping que viu o seu mandato prorrogado até Junho de 2012, altura em que Chefes de Estado e de Governo da União Africana irão tentar, mais uma vez, eleger o novo presidente da Comissão da União Africana. Na corrida contra Ping esteve a actual Ministra do Interior da África do Sul, Kasazana Dlamini Zuma.
O Curriculum dos dois candidatos é irrepreensível: ambos já foram ministro das Relações Exteriores dos respectivos Estados nomeadamente do Gabão e da África do Sul e, Jean Ping foi Presidente da Assembleia-Geral da ONU. As duas candidaturas tiveram o apoio das respectivas organizações económicas regionais (SADC para Zuma e CEEAC para Ping).
A disputa nos corredores foi tão intensa que até a ultima votação das três previstas, a diferença nunca foi suficiente para que Jean Ping renovasse o mandato. Se por um lado está o Gabão com laços muito fortes na francofonia, no outro estava a África do Sul na sua qualidade de maior potência económica do continente africano. È uma espécie de uma luta de Sansão contra Golias, embora as parcerias podem fazer a diferença.
O aparecimento de dois candidatos trouxe constrangimentos diplomáticos para os restantes Estados africanos porque tiveram que tomar partido por uma das partes, algo que dificilmente acontece nesses fóruns do continente. Embora esse exercício possa servir também para fomentar o espírito de democracia, diversidade de escolha e dinamismo da organização.
Por falar em dinâmica diplomática, quem não teve tempo para descansar foi a delegação angolana que, sem desejar viu-se envolvida numa disputa entre dois Estados das duas organizações económicas regionais a que é membro com plenos direitos. Mas o que ressaltou a vista é o facto de Angola estar na presidência em exercício da SADC, devendo por este facto apresentar, divulgar e promover a candidata da região, conforme os estatutos rezam.
Entre um contacto e outro, a delegação angolana saiu de Cimeira da CEEAC com a adopção da candidatura de Jean Ping por parte daquela organização. Alias, o próprio Ping foi o convidado de honra, o que é questionável já que estava em plena campanha para a sua própria sucessão.
A delegação angolana na UA foi chefiada pelo Ministro da Relações Exteriores, Georges Chikoti e integrou o Secretário de Estado das Relações Exteriores para os Assuntos políticos, Manuel Domingos Augusto, O Chefe de Estado foi representado pelo Vice-Presidente Fernando da Piedade Dias dos Santos. Ambos com uma vasta experiencia na diplomacia, sobretudo em África. O Ministro foi Secretário de Estado por muitos anos e desdobra-se bem nos corredores diplomáticos do continente, enquanto o Secretário de Estado foi representante de Angola na União Africana também por muitos anos.
Angola desenvolveu o trabalho, a disputa foi renhida e o candidato do qual Angola teve que vestir a camisola pelas circunstâncias, conseguiu um empate técnico. Esse processo foi bom para a diplomacia angolana porque o país conseguiu ensaiar as suas estratégias, sem, no entanto, ser o centro das atenções, pelo menos por parte dos medias, essa discrição servira mais tarde para virar as coisas a favor de Angola se necessário.
A dúvida mantêm-se, Jean Ping vai ou não renovar o seu mandato? Só saberemos em Junho depois da Cimeira do Malawi, a candidata da África do Sul promete surpresas. Pois, o leitor ainda se lembra do tema da 18ª Cimeira da UA? Os Chefes de Estado e de Governo também não se lembraram!