sábado, 25 de fevereiro de 2012

DIPLOMACIA VIA EXPRESSO LUANDA – PRETÓRIA

Por: Belarmino Van-Dúnem

No dia 19 de Fevereiro de 2012, domingo, o Presidente da África do Sul, Jocob Zuma, fez uma passagem relâmpago por Luanda para, junto do seu homologo angolano, José Eduardo dos Santos, fazer um briefing sobre o encontro que alguns Chefes de Estados tiveram no Benin, a convite do Presidente daquele Estado que é também o actual Presidente exercício da União Africana.
Os Chefes de Estado de Angola e da África têm estado em concertações periódicas, tanto em território angolano como na África do Sul. Há uma diplomacia directa, via expresso entre Luanda e Pretoria, capital administrativa da África do Sul. Os dois Estados têm responsabilidades acrescidas na arena internacional, mas a conjuntura política no continente africano e nas sub-regiões que a compõem é bastante sensível no momento e só irá prevalecer com capacidade de influência o Estado que melhor gerir a situação actual.
A África do Sul acordou e acaba de sair do sistema de “The Quiet Diplomacy of Liberation”, ou seja, a diplomacia do silêncio que caracterizou o país durante o período de transição (Christopher Landberg 2004). Hoje a África do Sul reclama de alto e bom som, o seu direito de intervir, como potência continental, nas questões mais cadentes que afligem a região austral e o continente africano em geral. Nota-se uma aproximação do Estado sul-africano aos seus pares, durante o mandato de Nelson Mandela, a diplomacia era feita com base na figura do Chefe de Estado, a África do Sul era levada por arrasto, prevalecia a figura do Mandela herói, conciliador e respeitado por todos.
A ascensão de Thabo Mbeki criou uma espécie de retiro da África do Sul no que concerne ao empenho directo nos problemas do continente africano. O Presidente Mbeki era mais elitista, formalista e com uma visão estruturante, por isso fazia sentir a sua presença nos fóruns internacionais e, em muitos casos, foi indicado como representante do continente. A visão funcionalista de Mbeki pode ser constatada nas suas acções, tais como: Primeiro Presidente em Exercício da União Africana e Co-fundador da NEPAD (sigla inglesa: Nova parceria para o Desenvolvimento de África).
A escalada de Jacob Zuma até ao poder criou novas esperança da África do Sul ascender de uma potência económica, expandindo a sua influência para a arena política. Zuma apareceu com um discurso voltado para África, maior e melhores parcerias com os países que fazem a diferença, quer política ou económica. O seu primeiro passo foi colocar Luanda e Pretória no centro das decisões políticas a nível da SADC e da UA, esforço que vinha sendo feito por Angola há décadas.
A África do Sul actualmente é a “auto-estrada” diplomática da África Austral e do continente. É membro não permanente do Conselho de Segurança da ONU; está em permanente contacto com os países emergentes através do IBSA (sigla inglesa: Índia, Brasil e África do Sul); mas este grupo se juntou ao BRIC (Brasil, Rússia; Índia e China) que passou a BRICSA (Brasil, Rússia, Índia, China e South África).
Este grupo é estratégico, politicamente falando e até do ponto de vista económico porque congrega dois membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU e três Estados com as economias mais prósperas da actualidade e do futuro. Para fazer o complemento, a África do Sul está a bater-se nos corredores diplomáticos do continente para colocar uma cidadã nacional a presidir a Comissão da União Africana, caso esse facto venha a acontecer, 2012 será o ano da diplomacia sul-africana, aquele país preside o Órgão de Politica Defesa e Segurança da SADC.
Angola, por sua vez, sempre esteve no centro da diplomacia universal e africana. A República de Angola é património diplomático de África: o Príncipe N´Funta, baptizado com o nome de António Manuel, com a alcunha de “Negrita” foi o primeiro Embaixador africano junto da Santa Sé em Roma, enquanto enviado de Sua Majestade, o Rei Mpangu-a-Nimi-a-Lukeni (Dom Álvaro II) em 1608, ano da sua precária chegada a Roma onde veio a falecer dias depois. Durante os séculos XVII, XVII e XIX, vários reis e rainhas destacaram-se como verdadeiros diplomatas, procurando a paz através do diálogo, com especial destaque para a Rainha N´Jiga M'Bande Ya N'Gola Kiluange Kya Samba.
No século XX, Angola destacou-se, principalmente desde a década de 50, quando os nacionalistas angolanos começaram a utilizar a via diplomática para denunciar os horrores do colonialismo, reivindicando a autodeterminação do território nacional. Essa dinâmica levou Angola a estar no centro da discussão nos fóruns mundiais, mesmo antes da independência, o território já era alvo de acesos debates na ONU.
Nas décadas de 70 e 80 Angola foi o centro da Guerra Fria em África, bateu-se pela independência do Zimbabué, da Namíbia e para o fim do Apartheid na África do Sul. O Primeiro Presidente de Angola, António Agostinho Neto caracterizava-se por ser um incontestável defensor dos direitos dos africanos e pana-fricanista convicto.
O Presidente José Eduardo dos Santos soube dar continuidade a esse legado, o Estado angolano é co-fundador da CPLP, dos PALOP, SADC e UA. Assenta a sua diplomacia na boa vizinhança e na prestação dos bons ofícios nos sectores da Paz e da Segurança, sem perder de vista a diplomacia económica, fim - último de qualquer politica externa.
A República de Angola granjeou um lugar no centro da diplomacia africana, o corredor diplomático Luanda – Pretória irá beneficiar os dois Estados e o continente e, caso os projectos de industrialização nacional se concretizem poderemos ver o grupo BRICSA, a transformar-se no BRICSAA (Brasil, Rússia, Índia, China, South África e Angola), até porque Angola tem uma parceria estratégica com o Brasil e a China; relações históricas com a Rússia, há um ambiente de diálogo salutar com a Índia e a “Diplomacia via expresso, Luanda – Pretoria vai de vento em popa”.


PRESIDENTE ABDOULAYE WADE ENTRE A ESPADA E ESPADA


Por: Belarmino Van-Dúnem

O conceito de democracia tem vindo a transformar-se ao longo do tempo. Desde a Grécia antiga onde o Poder do Povo tinha limitações de abrangência e inclusão, por exemplo as mulheres não votavam e os mais pobres não podiam ser candidatos a cargos públicos porque as funções de Estado não eram remuneradas, passando pelos tempos da discriminação pela raça e/ou sexo que os europeus durante vários séculos praticaram.
Actualmente, as principais questões prendem-se com as limitações de tempo, ou seja, se até a metade do século passado, o que se pedia e exigia era o cumprimento dos parâmetros constitucionais, actualmente levanta-se a falsa questão do tempo. Ninguém pode permanecer muito tempo no poder, tem que dar oportunidade aos outros. “Por amor de deus”. Quem manda é povo e a personalidade que está no poder deve consultar o povo para legitimar o exercício do poder. Inclusive podemos ir mais longe e afirmar que o voto popular não é, para a maioria dos casos, a forma mais assertiva de legitimar o exercício do poder. Sobretudo em África onde as clivagens étnicas, políticas e sociais são muito salientes.
Os problemas dos limites temporais no poder trazem ainda outro problema estrutural. O facto dos projectos políticos e de sociedade ficarem por concretizar, sabemos que a transformar da sociedade só é possível atravessando pelo menos duas gerações de dez anos. Ainda coloca-se o caso dos políticos que fazem uma espécie de permuta, ou seja, fica tu e depois volto eu.
O Presidente do Senegal, já no fim do seu segundo mandato de cinco anos, é um exemplo claro desse dilema. Quando foi eleito no ano 2000, colocou fim à mais de 40 anos de domínio socialista (PS) no Senegal no poder desde 1958. Actualmente com 86 anos de idade, o Presidente Wade, através do seu Partido PSD, efectuou uma alteração na constituição que colocou fim as limitações de candidaturas a presidência de dois mandatos de cinco anos cada. Mas, como é próprio dos juristas, a interpretação da lei está a provocar divergências. Uns defendem que a lei deve ser retroactiva, ou seja, as eleições do próximo dia 26 de Fevereiro de 2012 devem ser efectuadas com base na constituição de 2001. Mas outros acham que o Presidente Wade não está abrangido pela nova lei constitucional, portanto pode renovar o seu mandato pela terceira vez. Alias, o Tribunal constitucional já aceitou a sua candidatura.
A oposição e a sociedade civil é que não baixaram os braços e fizeram um levantamento contra a candidatura do actual presidente, que a luz da nova Constituição teria mais um mandato de sete anos. O movimento Forças Vivas da Nação de 23 de Junho (M23) cujo único objectivo é impedir a candidatura de Abdoulaye Wade, congrega a maioria dos partidos da oposição. O Conselho Constitucional do Senegal recebeu dezassete candidaturas, catorze foram aprovadas, mas os recursos não param de crescer.
A oposição está a perder sinergias porque não conseguiu um candidato consensual. Uma análise fria dos factos mostra que o problema pode não ser o presidente Wade, mas o facto de não existir um candidato a altura, no seio da oposição, para fazer face ao actual Presidente. Todos os candidatos da oposição alegam ser candidatos naturais e com probabilidade de vencer. Mas o mais mediático é o cantor e empresário Youssou N’Dour, embora não tenha qualquer tipo de experiencia política e até na administração pública.
A maior surpresa veio do Ocidente. Os EUA e a União Europeia, como sempre, decidiram posicionar-se e apelaram ao Presidente Wade que retirasse a sua candidatura, partindo para ameaças e tudo. Independentemente dos contornos existe a certeza que o Senegal que sempre teve alguma estabilidade, está a caminhar para o caos e as novas formas de impor democracia não respeitam a constituição dos Estados, mas o desejo ou não da opinião visível querer ou não quem está no poder.
É necessário repensar as formas de organização das sociedades, porque há tendência de existir um aproveitamento dos partidos políticos com relação aos midias: colocam os seus militantes nas ruas, aparecem duas centenas que passam a representar todo o eleitorado que, em alguns casos chegam a milhões. Se quem está no poder toma a decisão de colocar os seus apoiantes na rua, o acto fica catalogado como repressão e não só.
O Presidente Wade está entre a espada e a espada porque caso retire a sua candidatura estará a dar razão aos partidos da oposição e o seu partido já não vai a tempo de indicar um outro candidato. Se der continuidade a sua candidatura pode estar a caminhar para o início de uma escalada da violência que manchará para sempre a sua carreira. Agora é fazer ao contrário de São Tomé, ver e esperar.

18ª CIMEIRA DA UNIÃO AFRICANA

Por: Belarmino Van-Dúnem

A 18ª Cimeira dos Chefes de Estado e de Governo da União Africana constituiu um novo começo para organização continental a todos os níveis. Foi uma cimeira cheia de tensão e novidades: mais de uma dezena de Chefes de Estado e de Governo eram estreantes, alguns Estados ainda acordavam da turbulência de conflitos pós-eleitorais e a África do Norte participou no evento com o fantasma da primavera Árabe.
A Cimeira decorreu sob o tema “Reforçar o Comércio Intra-Africano”, mas desde a chegado do peritos ou delegações de avanço como são chamados os técnicos seniores nos fóruns internacionais, que as movimentações giraram a volta da renovação do Presidente da Comissão da União Africana e do Presidente em Exercício. Ao contrário do que tem sido costume, em que os Estados desistem das suas candidaturas para evitar a votação prevista nos estatutos da organização, na 18ª Cimeira tudo parece ter mudado, tanto para a Comissão como para a presidência em exercício havia rumores de que os pretendentes ao cargo iriam até a votação, mas só a África do Sul foi até ao fim na pretensão do cargo de Presidente da Comissão da UA.
A presidência em exercício estava reservada aos Estados da África Ocidental. O Benim desde muito cedo manifestou a sua intenção de assumir o cargo através do seu Chefe de Estado Yayi Boni. Mas houve notícias que os Presidentes da Nigéria, Goodluck Jonathan, e o do Gana, John Evans Atta Mills, também pretendiam candidatar-se para o cargo em nome dos seus Estados.
O gabinete do Presidente nigeriano fez sair um comunicado onde afirmou que, de facto, o Presidente Goodluck foi contactado por alguns Estados para assumir a presidência, mas que não era sua intenção devido a situação interna do país e, por outro lado, a Nigéria está na presidência rotativa da CEDEAO, portanto seria impossível cumprir com a agenda da União Africana. No que tange ao Gana não se conhece nenhuma reacção, nem a confirmar muito menos a desmentir a pretensão do cargo até a cimeira. O Chefe de Estado do Benin assumiu a presidência rotativa sem concorrência.
A mesma sorte não teve Jean Ping que viu o seu mandato prorrogado até Junho de 2012, altura em que Chefes de Estado e de Governo da União Africana irão tentar, mais uma vez, eleger o novo presidente da Comissão da União Africana. Na corrida contra Ping esteve a actual Ministra do Interior da África do Sul, Kasazana Dlamini Zuma.
O Curriculum dos dois candidatos é irrepreensível: ambos já foram ministro das Relações Exteriores dos respectivos Estados nomeadamente do Gabão e da África do Sul e, Jean Ping foi Presidente da Assembleia-Geral da ONU. As duas candidaturas tiveram o apoio das respectivas organizações económicas regionais (SADC para Zuma e CEEAC para Ping).
A disputa nos corredores foi tão intensa que até a ultima votação das três previstas, a diferença nunca foi suficiente para que Jean Ping renovasse o mandato. Se por um lado está o Gabão com laços muito fortes na francofonia, no outro estava a África do Sul na sua qualidade de maior potência económica do continente africano. È uma espécie de uma luta de Sansão contra Golias, embora as parcerias podem fazer a diferença.
O aparecimento de dois candidatos trouxe constrangimentos diplomáticos para os restantes Estados africanos porque tiveram que tomar partido por uma das partes, algo que dificilmente acontece nesses fóruns do continente. Embora esse exercício possa servir também para fomentar o espírito de democracia, diversidade de escolha e dinamismo da organização.
Por falar em dinâmica diplomática, quem não teve tempo para descansar foi a delegação angolana que, sem desejar viu-se envolvida numa disputa entre dois Estados das duas organizações económicas regionais a que é membro com plenos direitos. Mas o que ressaltou a vista é o facto de Angola estar na presidência em exercício da SADC, devendo por este facto apresentar, divulgar e promover a candidata da região, conforme os estatutos rezam.
Entre um contacto e outro, a delegação angolana saiu de Cimeira da CEEAC com a adopção da candidatura de Jean Ping por parte daquela organização. Alias, o próprio Ping foi o convidado de honra, o que é questionável já que estava em plena campanha para a sua própria sucessão.
A delegação angolana na UA foi chefiada pelo Ministro da Relações Exteriores, Georges Chikoti e integrou o Secretário de Estado das Relações Exteriores para os Assuntos políticos, Manuel Domingos Augusto, O Chefe de Estado foi representado pelo Vice-Presidente Fernando da Piedade Dias dos Santos. Ambos com uma vasta experiencia na diplomacia, sobretudo em África. O Ministro foi Secretário de Estado por muitos anos e desdobra-se bem nos corredores diplomáticos do continente, enquanto o Secretário de Estado foi representante de Angola na União Africana também por muitos anos.
Angola desenvolveu o trabalho, a disputa foi renhida e o candidato do qual Angola teve que vestir a camisola pelas circunstâncias, conseguiu um empate técnico. Esse processo foi bom para a diplomacia angolana porque o país conseguiu ensaiar as suas estratégias, sem, no entanto, ser o centro das atenções, pelo menos por parte dos medias, essa discrição servira mais tarde para virar as coisas a favor de Angola se necessário.
A dúvida mantêm-se, Jean Ping vai ou não renovar o seu mandato? Só saberemos em Junho depois da Cimeira do Malawi, a candidata da África do Sul promete surpresas. Pois, o leitor ainda se lembra do tema da 18ª Cimeira da UA? Os Chefes de Estado e de Governo também não se lembraram!

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

LIGA ÁRABE RECORRE À ASSEMBLEIA-GERAL DA ONO NO CASO SÍRIA

Por: Belarmino Van-Dúnem

A controvérsia sobre a Síria continua a fazer correr muita água nos corredores internacionais. Abandonado pelos seus parceiros regionais, Bashar al Assad, encontrou dois aliados que fazem a diferença no actual sistema das Nações Unidas, a Rússia e a China que, fazendo uso da prorrogativa de veto no Conselho de Segurança têm dificultado o ímpeto dos aliados Ocidentais.
No que respeita a Síria, os Estados da América Latina também têm se posicionando contra qualquer intervenção mais efectiva, sobretudo intervenções militares contra personalidades ou líderes cujas posições não agradam ou estão a margem das expectativas dos ocidentais.
A Síria, tal como a maior dos Estados árabes, foi assolada por uma onda de protestos populares que ficou mundialmente conhecida como a Primavera Árabe. Mas muito cedo os árabes descobriram que a primavera pode passar para o inverno sem uma época do verão.
Os Estados profundamente afectados pela onda de manifestações foram obrigados a verdadeiras revoluções em pleno século XXI. O objectivo era tentar abrandar as vozes contra as disparidades de tratamento que os Países Industrializados têm dado aos exportadores de matéria-prima, sobretudo de recursos energéticos. Mas também contra as alianças regionais que têm se revelado bastante eficazes na defesa dos interesses dos países em vias de desenvolvimento, a não efectivação dos Acordos de Parceria Económica, em substituição aos de Cotonou é um exemplo.
As manifestações na Síria se transformaram num braço-de-ferro entre a oposição e as autoridades. Como é evidente, os grupos na oposição não estão preocupados com as reformas constitucionais para o multipartidarismo, muito menos na realização de eleições, o que pedem é a saída do Presidente Assad.
A primeira tentativa de fazer passar uma resolução contra a Síria, por violação aos direitos humanos foi em Outubro de 2011, mas a Rússia e China vetaram e o Conselho de Segurança da ONU teve que ficar mais uma vez refém dos procedimentos antidemocráticos que caracteriza aquele órgão que decide sobre as questões de segurança a nível internacional.
O que causa alguma confusão de análise é o facto dos Estados da Liga Árabe que estão a pressionar para uma saída de Bashar al Assad terem regimes mais fechados, em termos de liberdades de cidadania que a Síria. Fazem parte da Liga Árabe a Argélia, Arábia Saudita, Catar, Comoros, Djibuti, Bahrein, Sudão, Marrocos, Tunísia, Egipto, Líbia, Sudão, Marrocos, Síria, Iémen, Somália, Líbano, Iraque, Jordânia, Sudão, Kuwait, Omã, Mauritânia. O Brasil, Venezuela, Eritreia e Índia são membros observadores.
Caso se faça uma observação atenta dos Estados que compõem a Liga Árabe facilmente chegaríamos a conclusão que a maioria continua sob regimes monárquicos tradicionais, ou seja, onde a realeza tem poderes legislativos e executivos, mas são esses os mais fervorosos e intransigentes no tange a saída de Bashar al Assad do poder.
As sanções que a Liga Árabe já aprovou contra a Síria não têm sortido efeitos efectivos. O incumprimento tem surgido no seio dos Estados membros que insistem em manter relações diplomáticas com o regime de Damasco.
Nunca é de mais lembrar que foi com base numa iniciativa da Liga Árabe que o Conselho de Segurança aprovou uma Zona de Exclusão Aérea contra o regime de Kadafi na Líbia. E com base nessa prorrogativa a OTAN efectivou a sua primeira missão fora do seu raio de influência ou legitimidade geográfica. Mas também ditou uma espécie de retorno da França à África, alias essa é uma das vitórias internacionais do Presidente Zarkozi para alem da intervenção na Costa do Marfim.
Não tendo conseguido fazer passar as sanções no Conselho de Segurança, a Liga Árabe teve que voltar as bases. A Assembleia Geral da ONU aprovou no dia 16 de Fevereiro de 2012, com o apoio da maior parte dos Estados membros, uma resolução contra a violação dos direitos humanos na Síria, assim como o Plano da Liga Árabe e sugere a passagem do poder para o Vice-Presidente sírio com a saída do poder do actual Chefe de Estado Bashar al Assad.
Neste momento a luta não é a favor de uma maior abertura do regime na Síria, nem tão pouco a saída do regime no poder, mas sim a saída do Presidente Assad. É claro que essa solução não é a melhor porque o problema não é o Presidente, mas as estruturas do Estado e a saída de uma personalidade pode levar o país a se transformar num segundo Iraque, Egipto e mesma a Líbia onde a repressão parece aprofundar-se para não falar do “far west” onde cada um possui uma arma e dispara para onde e quem lhe apetecer.
Mas também notei com admirar o jogo de cintura dos embaixadores da França, EUA e Reino Unido que votaram a favor na Assembleia Geral e foram mais longe ao afirmar que o voto da Assembleia Geral da ONU era determinante para que a organização adoptasse medidas mais efectivas contra a Síria. Mas são esses mesmos Estados que, de forma repetida, ignoram e desautorizam a Assembleia Geral, vetando tudo que vai contra os seus interesses, em alguns casos nota-se a verdadeira insensibilidade desses Estados, como tem sido no caso palestino. Caso de esperar o que vem por ai, a França está disposta a participar numa missão militar, enquanto a Rússia afirmou que está a estudar a possibilidade do envio de capacetes azuis para a Síria. Mas a verdade é uma: È necessário fazer alguma coisa pelo povo sírio.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

NIGÉRIA DA NORMALIZAÇÃO POLITICA A INTOLERÂNCIA RELIGIOSA

Por. Belarmino Van-Dúnem

A Nigéria é um Estado que dispensa qualquer tipo de apresentação. Sendo um dos primeiros Estados da África subsariana a beneficiar do boom das receitas do petróleo, os nigerianos acabaram por criar uma imagem externa que não condizia com as clivagens étnicas, religiosas e sociais do país real.
Nos finais da década de 70, sobretudo nos anos 80, o país foi literalmente cortado de norte a sul, o brilho do asfalto fazia antever um futuro risonho para todos os nigerianos. Mas a queda do preço do petróleo criara grandes constrangimentos, levando o Estado a sucessivas crises em função do grande débito externo adquirido para a construção de infra-estruturas. A situação de bancarrota e a pressão externa para pagar os juros dos empréstimos, criaram um ambiente propício para anarquia e como consequência a emergência dos militares no poder.
Os golpes de Estado na Nigéria começaram cinco anos após a proclamação da independência em 1960. No ano de 1966, o país teve os dois primeiros golpes de Estado perpetrados por militares, na sequência foi instalado um regime militar. No ano seguinte, em 1967, o grupo étnico ou linguístico Ibo tentou lutar a favor da secessão da região de Biafra, tendo acabado por perder a guerra em 1970. Quando se pensava que o país iria viver momentos de paz e reconciliação, todos foram surpreendidos pelo Golpe de Estado de 1975 liderado pelo Brigadeiro, Murtala Ramat Mohammed. Mas um ano depois, em 1976, houve mais um Golpe de Estado e o desaparecimento físico do Presidente, fez ascender ao poder o General Olusengun Obansanjo.
No ano de 1979, os nigerianos elegeram Alhaji Shehu Shagari como chefe de Estado, tendo sido reeleito em 1983. Mas o segundo mandato não durou mais do que um ano, houve um golpe de Estado que levou ao poder o Manjor-General, Muhammudu Buhari. Não passaram dois anos, um dos colegas de armas de Buhari e com a mesma patente militar, decidiu tentar a sorte com um golpe, na sequência chegou ao poder Ibrahim Babangida, contava o ano de 1985.
O Manjor-General, Ibrahim Babangida tinha uma retórica que deixava algumas esperanças do retorno de um governo civil na Nigéria. Tendo mesmo legalizados os partidos políticos em 1989 e realizados eleições autárquicas e para a Assembleia Nacional. No ano de 1990, houve uma tentativa de golpe de Estado, mas foi rapidamente repelida pelas forças armadas oficiais.
Tendo sobrevivido a tentativa de golpe de Estado, Babangida marcou as eleições presidenciais para o ano de 1993. O escrutínio foi bastante criticado pela oposição, alias como em todo continente africano, um dos candidatos auto-proclamou a sua vitória, trata-se de Moshood Abiola. Por Decisão do Conselho Nacional de Defesa e Segurança, as eleições foram anuladas. O Presidente Babangida não resistiu aos protestos e abdicou do poder, tendo sido substituído por Ernest A. Oladeinde Shonekan, empresário e advogado que só conseguiu resistir no poder durante três meses, em Novembro de 1993, seguiu o exemplo de Babangida e abdicou do poder também. Na sequência o General Sani Abacha, não pestanejou e proclamou-se Presidente da República Federativa da Nigéria.
O General Sani Abacha também embarcou no discurso da abertura, depois de dissolver as duas Câmaras, instalou um regime próprio. No ano de 1998, Sani Abacha acabou por falecer, cujas causas estão por esclarecer. O General Abdulsalami Abubakar substituiu o Presidente Abacha, tendo marcado as eleições um ano mais tarde. Apesar do regime democrático, na sequência do pleito eleitoral de 27 de Maio de 1999 saiu vencedor um General, Olusengun Obansanjo que já havia liderado um golpe de Estado em 1976, tendo exercido o poder até 1979.
A eleição de Obasanjo colocou fim aos regimes militares na Nigéria. Depois de conseguiu a sua reeleição em 2003. Em Abril de 2007, os nigerianos elegeram Umaru Yar’Adua como Presidente da República. Yar’Adua só dirigiu o país por um período de três anos, acabou por falecer em 2010 por doença prolongada. Tendo sido substituído por Goodluck Jonathan que foi confirmado no cargo em 2011 através de eleições.
A normalização do poder político fez emergir um outro problema mais grave: A divisão entre muçulmanos e cristãos. O sul da Nigéria é habitado por uma maioria cristã e o norte por islâmico, a coabitação entre esses dois grupos religiosos não tem sido das melhores.
Desde a eleição do Presidente Goodluck, o país tem sido assolado por vários ataques, com principal destaque para o grupo radical “Boko Haram” (Educação não islâmica é pecado) que tem perpetrado vários ataques, causando vários mortos.
Na Nigéria está a se efectivar a teoria do “Choque de Civilizações”. As vítimas de um lado e do outro são escolhidas pelo credo religioso. O próprio Presidente da República que é cristão e com origens do sul do país, manifestou a sua frustração porque segundo ele existem membros do Senado e do seu próprio governo que dão apoio e cobertura aos grupos radicais islâmicos.
A Nigéria é o país mais populoso de África e um dos maiores exportadores de petróleo, se não o maior, é a maior potência da África Ocidental. Aquele país tem dado grandes contributos para a paz na região sob sua influência, tendo liderado as intervenções da CEDEAO na Libéria e na Serra Leoa. Mas agora parece que essa liderança está, cada vez mais em causa, tudo por causa da intolerância religiosa que continua a vitimar centenas de pessoas.